“O capitalismo é uma religião
puramente cultual, talvez até a mais extremada que já existiu. Nele, todas as
coisas só adquirem significado na relação imediata com o culto; ele não possui
nenhuma dogmática, nenhuma teologia.” (BENJAMIN, 2013, p. 21) . O culto, entendido como “um conjunto de
ritos e práticas de veneração ou de propiciação de divindades, de ancestrais,
de seres sobrenaturais ou de certos símbolos (JAPIASSÚ, 2006, p. 63) ”, no que se refere à
religião capitalista, parece ser evidenciado em símbolos e divindades. Se no
cristianismo a cruz aparece como símbolo central da fé no Cristo ressurreto, no
capitalismo as cédulas bancárias se
apresentam diariamente para evocar o culto
capitalista. Elas, mais do que
qualquer outra coisa, mostram-se para a sociedade contemporânea como resolução
das preocupações e inquietações humanas. Não por acaso, a elas presta-se a veneração. Mas “o papel-moeda é apenas uma das
manifestações de uma divindade mais fundamental do sistema capitalista cultual:
o dinheiro” (LÖWY, 2005) .
Sobre isso, Walter Benjamin deixa uma referência bastante interessante em seu
fragmento de 1921 do pensador anarquista Gustav Landauer:
"Fritz
Mauthner ("Wörterbuch der Philosophie") mostrou que a palavra
"Deus" (Gott) é originariamente idêntica a "ídolo" (Götze),
e que as duas querem dizer "o fundido" [ou "o escorrido']
(Gegossene). Deus é um artefato feito pelos humanos, que ganha uma vida, atrai
para si as vidas dos humanos e finalmente torna-se mais poderoso que a
humanidade. O único escorrido (Gegossene), o único ídolo (Götze), o único Deus
(Gott) a que os humanos deram vida é o dinheiro (Geld). O dinheiro é artificial
e é vivo, o dinheiro produz dinheiro e mais dinheiro, o dinheiro tem todo o
poder do mundo. Quem não vê, quem ainda hoje não vê, que o dinheiro, que o Deus
não é outra coisa senão um espírito oriundo dos seres humanos, um espírito que
se tornou uma coisa (Ding) viva, um monstro (Unding), e que ele é o sentido
(Sinn) que se tornou louco (Unsinn) de nossa vida? O dinheiro não cria riqueza,
ele é a riqueza; ele é a riqueza em si; não existe outro rico além do
dinheiro" (Ibid).
Muito
provavelmente, Benjamin assumiu esta colocação de Landauer para se referir apenas
a essa divindade viva do capitalismo.
Pois não parece ser possível conceber em seu pensamento “Deus como um artefato
feito pelos humanos”, ao menos levando em conta sua origem judia. De qualquer modo, não é
difícil reconhecer na contemporaneidade o culto ao dinheiro, propagado fundamentalmente a
partir do consumo.
Atualmente, vê-se que o consumo passou a ser, na prática, a finalidade do bicho homem. Todos querem ter, possuir, consumir. Esta "necessidade" da criatura contemporânea não se relaciona a outra coisa senão a um comportamento religioso, isto é, uma postura de fé diante as adversidades. Este culto ao capital, que escraviza e destrói, origina-se fundamentalmente da criação de um deus que por ser ele mesmo também criatura é incapaz de expiar o pecado do homem. Neste sentido, quanto mais se vivifica o aspecto litúrgico do capitalismo, mais se perde o humano do homem, isto é, mais se negligencia a grande característica do homem em ser chamado humano, a saber, a racionalidade. Por isso, diferente do cristianismo, em que o próprio apóstolo Paulo na carta aos romanos refere-se ao culto cristão como um culto de caráter racional, no capitalismo o culto caracteriza-se por uma irracionalidade completa, onde o individuo engana-se e é enganado ao tempo todo pela epidemia do consumo.
Atualmente, vê-se que o consumo passou a ser, na prática, a finalidade do bicho homem. Todos querem ter, possuir, consumir. Esta "necessidade" da criatura contemporânea não se relaciona a outra coisa senão a um comportamento religioso, isto é, uma postura de fé diante as adversidades. Este culto ao capital, que escraviza e destrói, origina-se fundamentalmente da criação de um deus que por ser ele mesmo também criatura é incapaz de expiar o pecado do homem. Neste sentido, quanto mais se vivifica o aspecto litúrgico do capitalismo, mais se perde o humano do homem, isto é, mais se negligencia a grande característica do homem em ser chamado humano, a saber, a racionalidade. Por isso, diferente do cristianismo, em que o próprio apóstolo Paulo na carta aos romanos refere-se ao culto cristão como um culto de caráter racional, no capitalismo o culto caracteriza-se por uma irracionalidade completa, onde o individuo engana-se e é enganado ao tempo todo pela epidemia do consumo.
BIBLIOGRAFIA
BENJAMIN, W. O capitalismo como religião.
Tradução de Nélio Schneider e Renato Ribeiro Pompeu. 1a. ed. São Paulo:
Boitempo, 2013.
JAPIASSÚ, H. . M. D. Dicionário
Básico de Filosofia. 4 ed. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2006.
LÖWY, M. O
Capitalismo como Religião. Tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves. São
Paulo: Folha de São Paulo, Caderno Mais, 2005.
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